segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Por que o livro ‘1984’ está de volta. E o que isso diz sobre o presente.

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Por que o livro ‘1984’ está de volta. E o que isso diz sobre o presente


Obra publicada em 1949 chegou ao primeiro lugar na lista de mais vendidos da Amazon na última semana

UM DOS TEMORES ANTECIPADOS PELO LIVRO DE ORWELL ERA O DA ECLOSÃO DE UMA GUERRA NUCLEAR, TENSÃO QUE ATRAVESSARIA TODA A GUERRA FRIA

O presidente recém-eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, tem sido o sujeito de um sem-número de manchetes neste início de ano. Ele não é conhecido por ser um amante da literatura, mas é parcialmente responsável por renovar a popularidade de um dos clássicos da literatura de língua inglesa do século 20: “1984”, de George Orwell, publicado em 1949.
Passada uma semana desde a posse de Trump, o romance distópico de Orwell é o livro mais vendido na Amazon. O acontecimento pontual que o catapultou a essa posição foi uma declaração dada no dia 22 de janeiro por Kellyanne Conway, conselheira do presidente americano, no programa “Meet The Press”, da emissora “NBC”. Conway refutou os dados de audiência veiculados pela mídia que demonstravam que a cerimônia de posse do novo presidente havia sido esvaziada, e disse que o governo trabalhava com “fatos alternativos”.
A ideia da inexistência de uma realidade objetiva e factual promovida pela conselheira remeteu, para jornalistas e leitores, à realidade controlada do romance de Orwell, no qual um “Ministério da Verdade” edita permanentemente os fatos do passado e do presente.
O cenário de “1984” é a Oceania, um dos três blocos, permanentemente em guerra entre si, em que todo o planeta se divide. Governada pelo regime totalitário do Partido, a Oceania é a casa do protagonista Winston Smith, alguém que passa gradativamente a questionar e resistir à interferência e vigilância do Estado em todas as esferas da vida do indivíduo.

Por que ‘1984’ se mantém atual

Em um dos textos de uma nova coleção de ensaios de George Orwell que será lançada em março pela editora Companhia das Letras, com o título de “O Que é Fascismo e Outros Ensaios”, o autor se queixa, ainda nos anos 1930, do desgaste da palavra “fascista” nas discussões, algo que volta a ocorrer hoje. Este é, segundo Flávio Moura, editor da Companhia das Letras, responsável pela publicação de “1984” e outros títulos do autor, um dos sinais da sensibilidade política e da atualidade do pensamento de Orwell.
Segundo Moura, por ser um clássico, “1984” nunca perde o interesse. “Mas em qualquer momento em que haja uma ameaça de autoritarismo mais forte, ele ganha imediatamente atualidade”, disse, em entrevista ao Nexo. O fato de haver sempre algo que faz com que se volte a ela é apontado por ele, inclusive, como um termômetro de sua qualidade e sobrevivência ao tempo. Neste momento, seu reaparecimento está ligado à “pós-verdade”, à perda de relevância dos fatos e à valorização da versão em que se prefere acreditar.
“Orwell é muito bom. Teve uma sensibilidade muito grande para os riscos de autoritarismo e totalitarismo, de ambos os lados [de esquerda e direita]”, diz Moura. Além disso, de acordo com o editor, a força estética impressa no texto garantiu sua durabilidade, impedindo-o de ficar datado.

Quais são as analogias feitas entre o governo Trump e o livro

A ‘AMNÉSIA POLÍTICA’
Em um artigo para o site New Republic, a jornalista Josephine Livingstone compara Trump às autoridades de “1984” no “esquecimento” voluntário de inimigos e alianças do passado. Nesse sentido, a Rússia, rival histórica na política externa americana, é propagandeada como uma aliada. Para ela, também há relação entre a política do presidente em relação à fronteira com o México e a política de guerra perpétua do “Grande Irmão”, a autoridade máxima do regime de Orwell.
2+2=5
O convencimento da população a respeito das “verdades alternativas” do Partido em “1984” ia tão longe que fazia crer em um resultado diferente para uma operação matemática exata. Uma matéria do “The New York Times” que elegeu a obra como o livro para ser lido em 2017, fez uma analogia entre a operação matemática equivocada do livro e a contagem do número de presentes na posse de Trump, largamente exagerada pelos dados oficiais embora fotos aéreas tenham mostrado o quórum baixo no evento do dia 20 de janeiro.
A NEGAÇÃO DA CIÊNCIA
Em “1984”, não existe ciência ou verdade objetiva, provada empiricamente. A fluidez do conceito de “verdade” ou de máximas comprovadas pelo estudo científico se relaciona à negação do presidente americano sobre o aquecimento global, ainda que seus efeitos tenham sido comprovados por diversos estudos.

Outros momentos da história dos EUA que impulsionaram a venda do livro

O pico visto agora, na verdade, não é uma surpresa total. O livro está há três anos na lista dos 100 mais vendidos da Amazon, segundo o site The Atlantic. Mas para um livro que tem mais de 60 anos de publicação, estar em primeiro lugar na lista é inusitado, no mínimo.
Como disse o editor Flávio Moura, o livro é “sacado” sempre que um cenário mostra uma faceta autoritária. Nos anos 1970, nos Estados Unidos, ele foi usado para se referir à administração de Nixon, que dava informações desencontradas sobre a Guerra do Vietnã e o caso de Watergate, segundo o “The New York Times”.
Em 2013, após o escândalo de espionagem da NSA, as comparações com o regime do “Grande Irmão” ressurgiram. Na ocasião, as vendas na Amazon aumentaram 7.000%, alçando a obra da posição 13.074 na lista de mais vendidos para a 193ª.
O gráfico de buscas no Google mostra picos de interesse em 2013, 2014 e agora, em 2017:
 

O que Orwell não imaginou

“Convém não exagerar muito [na analogia] entre o livro e a conjuntura Trump”, alerta Flávio Moura, no entanto. Quando escreveu, Orwell tinha em mente sociedades fechadas e autoritárias: as relações mais imediatas são com fascismo e com o regime soviético.
O editor aponta como diferenças o fato de que o partido de Trump, o Partido Republicano, é secundário na sua vitória. O presidente é “um aventureiro” em um país democrático em que há, apesar dos ataques, liberdade de imprensa. “O que Orwell tinha em mente era o controle, até que ponto o Estado autoritário pode controlar o cidadão”, diz. Nos EUA de hoje, esse controle é “mais pulverizado e difícil de interpretar”. 
Em seu artigo para o site New Republic, Josephine Livingstone chama atenção para o fato de que “1984” não é um romance sobre o capitalismo global. O mundo que levou Trump ao poder, como descrito por ela, é essencialmente esse, imprevisto pelo livro: devastado pelo capitalismo e comandado pelas celebridades.
Uma matéria publicada no site The Conversation também descreve o momento atual como “mais estranho” do que a realidade de “1984”. Nos Estados Unidos de hoje, 84% dos americanos - porcentagem de pessoas com acesso à internet no país - têm acesso a todo tipo de informação, enquanto no livro um pequeno grupo dentro de um partido único a detinha. “Orwell não poderia ter imaginado a internet e seu papel na difusão de fatos alternativos, nem que pessoas carregariam ‘teletelas’ em seus bolsos sob a forma de smartphones. Não existe um Ministério da Verdade controlando e difundindo a informação, mas de certa forma, todo mundo é o ‘Grande Irmão’”, diz o texto.
Não se trata, segundo o ponto de vista da matéria do “The Conversation”, de ser incapaz de ver através da verdade, mas de as pessoas estarem dispostas a abraçarem os “fatos alternativos”. Elas decidiram de antemão o que é “mais verdade” que os fatos, e esses fatos alternativos se confirmam em suas timelines do Facebook, sem que se precise de um “Grande Irmão” para isso.

TRÊS OUTROS LIVROS PARA O MOMENTO

‘As Origens do Totalitarismo’, de Hannah Arendt (1951)

A mesma semana que elevou a procura por “1984” também levou o livro da teórica Hannah Arendt para a lista de mais vendidos da Amazon. Seu contexto de escrita é o mesmo de Orwell: ela examina a soma de fatores que levaram à ascensão de Hitler e Stálin e à eclosão da 2ª Guerra Mundial. A filósofa alemã mostra como uma narrativa centralizadora pode criar bodes expiatórios para populações em situação de pressão econômica e tensão política.

‘O Processo’, de Franz Kafka (1925)

Josephine Livingstone, jornalista do “New Republic”, acredita que o livro que melhor representa a era dos “fatos alternativos” é o romance de Kafka em que Josef K. acorda em seu aniversário de 30 anos e vai preso sem saber o porquê.  Ele não consegue conceber o que está acontecendo porque acredita viver em um país livre, em paz com todas as nações, com as leis em bom funcionamento. Para ela, o real perigo oferecido pelo presidente americano tem a ver com essa ameaça subjacente, por baixo da fachada de “país da liberdade”. Assim como Josef K. acha, de início, que sua prisão é uma piada, Trump levou muito tempo para ser levado a sério, até que fosse eleito.

‘Desagregação’, de George Packer (2013)

Flávio Moura indica “Desagregação” como um livro mais pertinente e atual para compreender especificamente o fenômeno da eleição de Donald Trump e quem é seu eleitorado. Nele, Packer, jornalista da revista “The New Yorker” narra a história das últimas três décadas nos EUA, a crise de sua democracia, a falência do sistema político e o desnorteamento dos cidadãos. 

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